quinta-feira, 24 de março de 2011

Ainda sobre o Mundo de Pernas para o Ar

Há uns anos trabalhei na venda de uma empresa. Fui responsável pela avaliação da mesma e pelo fornecimento de documentos a potenciais compradores.

Uma das perguntas mais frequentes que me faziam com alguma irritação e suspeita era onde estava o passivo da empresa porque não se via nos documentos. E lá explicava que a empresa não tinha passivo, tinha todas as suas dívidas, incluindo empréstimos bancários, saldadas.

A cara que me faziam nesta altura era de pasmo. Mas, diziam, e diziam sempre, como não têm passivo? Os juros estão tão baixos, não faz sentido não terem passivo! Os empréstimos eram sempre vistos como uma oportunidade, para crescer, para investir.

Imagine-se, ter dívidas passou a ser bom e sinal de boa gestão. Durante anos, em Portugal, e não só, ter dívidas passou a ser algo banal. O que estava bem era pedir empréstimo atrás de empréstimo, investir o dinheiro, afinal os juros eram baixíssimos e os investimentos prometiam pagar mais do que os juros, e levar a vida como se não houvesse amanhã. E os bancos sempre a alimentar esta loucura: fazer empréstimo de casa a 50 anos, morrendo antes de a pagar, por exemplo, um conceito que sempre me deixou banzado, tornou-se normal. Ninguém punha fim nisto.

Pois é. O amanhã chegou. É hoje. E este país-cigarra vai ter que suplicar muito às formigas para lhe darem umas migalhas durante o Inverno que aí vem. Só que o Inverno está a ser rigoroso e nem as formigas estão com muita disponibilidade. Vai ser giro, vai.

Nunca pensei, e eu sou um pessimista por natureza, ter de assistir à vinda do FMI para Portugal durante a minha vida adulta. Sim, os políticos são uns irresponsáveis, a mama do Estado é um exagero, mas a sério que nunca pensei que a coisa fosse tão mal. Mesmo quando esbracejava contra mais um auditório ou museu municipal de luxo, muito acima das possibilidades ou necessidades das populações, queria acreditar que alguém poria fim a isto se as coisas saissem de controlo. Mas sairam.

Sabem qual é a minha reacção? Pela primeira vez na vida quero tornar-me membro de um partido. Não sei qual. Mas não posso continuar a ver os outros levarem-me à desgraça e não agir, com medo de me sujar na imundície partidária. Mesmo que isso signifique votar derrotado o resto da minha vida. Mas é hora dos partidos representarem a sociedade. A sociedade não pode continuar alheada dos partidos. É preciso haver quem - por exemplo - tenha a coragem de no próximo congresso do PS propor a substituição de José Sócrates. Como é que um dos maiores partidos de Portugal se tornou nisto? Quando é que nós deixámos de chamar os bois pelos nomes?

Penso que única maneira de todos aqueles que se demonstraram há semanas - a tal geração à rasca - pode ajudar a mudar as coisas é em peso filiar-se nos partidos políticos. Esta atitude de não querer saber, de os outros decidirem por mim, de não me querer sujar não resultou.

É uma coisa não ir às reuniões de condomínio. Tenho que aceitar que viver em democracia tem um preço. Está na altura de pensar que partido melhor representa o meu ideal de sociedade e filiar-me e lutar pelo que acredito.

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